Sobre sonhos

Ultimamente tenho pensado tanto em sonhos… talvez porque a realidade às vezes chuta a gente com força, não tem como não perceber, nem como não sentir dor. Os sonhos colocam a gente em outro universo, num mundo mais bonito, mais colorido, onde tudo é possível. Duas coisas conversam dentro da minha cabeça hoje.

Uma é o trecho de uma música que sempre me traz novos insights (Let Her Go – The Passenger) e diz assim: “Staring at the bottom of your glass, Hoping one day you’ll make a dream last, But dreams come slow, and they go so fast. (…) Maybe one day, you’ll understand why everything you touch surely dies” – em tradução livre: “Olhando para o fundo de seu copo, Esperando que um dia você fará um sonho durar, Mas os sonhos vêm devagar, e vão embora tão rápido. (…) Talvez um dia você entenda que tudo o que você toca certamente morre”.

A outra coisa é uma dinâmica que participei durante um curso de teatro. Cada pessoa da turma deveria encher dois balões no sopro. Enquanto soprássemos, nos foi recomendado colocar o pensamento em nossos sonhos mais preciosos e profundos e, ao soprar, sentir que eles eram guardados naqueles balões. Após alguns momentos de contemplação daqueles sonhos, fomos dados um palito de dentes cada um e nos reunimos em uma roda.

A partir daí, se me recordo bem, a orientadora dava instruções para que alguém estourasse os balões de outra pessoa. A pessoa dona do balão deveria então falar sobre o que sentiu ao ver seu balão estourado. Essa atividade me marcou porque eu fui a pessoa que mais pareceu sentir a pancada daquele balão estourado. A orientadora pediu que eu contasse o que sentia naquele momento e eu, aos prantos, tentei explicar a importância daqueles sonhos, e que eu estava assim porque eles me haviam sido roubados. Foi então quando o amigo que era minha dupla na aula me falou com serenidade: “Mas você pode sonhar novos sonhos”, ao que a orientadora acrescentou “Marcella, foi você que sonhou tudo… a fonte é você”. E aquelas palavras me acalmaram quase que instantaneamente, as lágrimas secaram e eu entendi que não precisava chorar.

A conversa que estas duas coisas tiveram dentro de mim hoje – a música e esta lembrança dos balões – falava sobre a rapidez com que a vida passa, e mais que isso, como os sonhos/desejos vêm com uma força absurda e de repente somem do nosso alcance. Às vezes sentimos vontade de nos agarrar a momentos, a pessoas e contextos pelo fato de enxergar algo importante e precioso naquilo, que pode não mais estar ao nosso alcance no momento seguinte. Mas nos esquecemos que no momento em que sentimos tocar a realidade com as mãos, é ali que ela se perde, ela morre, porque tudo muda num instante. Mesma coisa com o tempo, não importa o quanto tentamos parar ou acelerar o tempo, ele muda de velocidade conforme a nossa perspectiva.

O “questionar o sentido da vida” me levou a identificar uma urgência em “viver intensamente” muitos anos atrás, isto é, não desperdiçar momentos. E ao longo dos anos eu entendi que o momento presente era o mais importante e deveria ser vivido como tal. Mas chegou primeiro a pandemia, depois a quarentena, o isolamento… e 3 meses no Brasil, daí veio um redemoinho de emoções em consequência disso tudo. E eu me peguei pensando que reverenciar o presente não é mais suficiente, eu preciso pegar as rédeas da criação destes momentos. Entendi no fim das contas que são os sonhos que imitam a vida, e não o contrário. A fonte dos nossos sonhos vem daquilo que alimentamos em nossas vidas, nós somos os criadores de tudo. E se viver quiser dizer não poder tocar a realidade (porque senão ela morre), tudo bem. Mesmo que alguns todos os sonhos se tornem balões vazios, existe material dentro da gente para encher muitos e muitos balões, a gente só precisa respirar fundo e se concentrar no que importa para criar novos sonhos. Quando a maior catástrofe nos atinge e ficamos sem direção, é bom lembrar disso: não é uma “força do além” que coloca sonhos dentro da nossa mente e do nosso coração. Nós mesmos fazemos isso, mesmo sem perceber, e podemos refazer, desfazer ou mudar o que foi feito lá atrás com atitudes novas hoje.

Eu que sempre fui a rainha do “deixa a vida me levar” no campo dos sonhos, hoje me pego dando passos para trás e buscando estudar, compreender e traçar estratégia de novos sonhos que eu quero criar. Hoje eu sei que muitos destes sonhos vão morrer… sim, eles serão destruídos. Mas o material da criação está aqui dentro, vivo em mim, então até mesmo no mundo dos sonhos a gente tem as rédeas nas mãos, acredite. O que você tem vivido está te ajudando a criar bons sonhos? Ou você está distraído(a) com os belos balões que tem e esquecendo da sua capacidade de recriá-los, caso eles estourem?